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Trilhas da Cena

Sinopse

O espetáculo da Cia dos Comuns conecta as rainhas do Império Méroe às mulheres negras brasileiras. A montagem apresenta experiências femininas afro-brasileiras através de histórias reais de mães trabalhadoras e líderes religiosas em suas comunidades. A obra integra dança, música de origem africana e depoimentos que revelam trajetórias em diversos contextos sociais. O projeto expõe questões de identidade e representatividade, demonstrando o papel central dessas mulheres na preservação cultural e transformação social. A produção parte das Candaces africanas para construir uma narrativa sobre liderança feminina negra e sua influência em movimentos contemporâneos brasileiros.

O espetáculo

Em cena, um painel de histórias protagonizadas por personagens absolutamente comuns, mostra um retrato fiel da bravura cotidiana da mulher negra brasileira e de quanto é poderoso o ser feminino: a mulher que luta para oferecer um futuro digno para o filho; duas irmãs criadas no mesmo ambiente, mas que o destino reservou um futuro diferente para cada uma delas; a dor da mãe que precisa conviver com a perda do filho amado e sem o apoio do marido entregue à bebida; a mulher que precisa enfrentar o preconceito e o descaso por ser considerada uma velha inútil; a mulher que se dedica aos cultos de matriz africana e luta contra a possível perda do terreno sagrado onde se localiza o terreiro de candomblé, alicerce espiritual da comunidade.

 

Contribuindo para o desenrolar de cada história, a dança e as sonoridades de raiz africana presentes nos cultos de candomblé brasileiros, uma característica no trabalho cênico desenvolvido pelo diretor Marcio Meirelles. Candaces contou ainda com a experiência artística de renomados profissionais do teatro brasileiro como Zebrinha nas coreografias e movimentos corporais, Biza Vianna nos figurinos, Marcos Povoas e Puan Viana na música e Jorginho de Carvalho no design de luz. Além disso, trechos de depoimentos femininos em off são escutados ao longo do espetáculo, o que torna a vida ainda mais presente no palco.

 

O texto de Candaces foi construído a partir das experiências pessoais de cada integrante do elenco e também de importantes depoimentos apurados através de exclusivas entrevistas com 28 diferentes mulheres, verdadeiras “Candaces” de nossos tempos. Zezé Mota, D. Zica da Mangueira, Elza Soares, Veluma, D. Ivone Lara, Ruth de Souza, Léa Garcia, Tia Surica, Jurema Batista,  Leci Brandão, Chica Xavier e Tia Doca foram algumas das cidadãs que concordaram em colaborar com o trabalho de pesquisa para a criação do espetáculo Candaces.

Texto da curadoria

texto em desenvolvimento

 

XXXXXXXXXXXXX é pesquisador(a) e curador(a) do projeto O teatro e a democracia brasileira.

Ficha técnica e artística

Texto: Marcio Meirelles, com a colaboração da Cia dos Comuns

Pesquisa: Débora Almeida, Gustavo Melo e Rodrigo dos Santos

Direção: Marcio Meirelles

Coreografia: Zebrinha

Figurinos: Biza Vianna

Musica: Marcos Povoas, Puan Viana

Oficina de percussão: Regina Café

Cenário: Marcio Meirelles

Desenho de Luz: Jorginho de Carvalho

Elenco: Cridemar Aquino / Cynthia Rachel / Débora Almeida / Denis Gonçalves / Fábio Negret / Fernando Barcellos / Flávia Souza / Gustavo Melo / Hilton Cobra / Puan Viana /  Rodrigo dos Santos / Tatiana Tibúrcio / Valéria Monã / Vânia Massari

prêmios e clipping

Candaces ganhou o Prêmio Shell/2003 de Melhor Música (Marcos Povoas e Puan Viana), tendo sido indicado em mais 3 categorias:

Direção, Figurino e Categoria Especial/Coreografia).

Foi também eleito pelos Jornais O Globo e Jornal do Brasil como um dos 10 melhores espetáculos de 2003.

Depoimentos e trechos da dramaturgia

Ô, moço ajuda. Meu filho tá caído assim e sujo, mas ele não é vagabundo não. Ele tá é cansado. A gente tá muito cansado de tudo isso… Ele cansou de procurar emprego. Outro emprego melhor do que o do pai… de pedreiro, porque emprego de pedreiro não é respeitado, não. Trabalha como dá… não conseguiu outro emprego, porque  não tinha estudo. Mas a gente cansou de procurar estudo pra ele.

 

[…] Calu era mestre de obra e eu lavava… mas o dinheiro não dava pra tudo, não. A gente tinha que cuidar do pai de Calu, que era cego e não tinha previdência. E da irmã de minha mãe que morava com a gente e era fraca do juízo. Aí, o meu menino teve que ajudar o pai. Eu mandei o pai ensinar o ofício. Perdeu interesse pelo estudo. Cansou. Cansou de chegar na porta da escola e voltar porque não tinha aula. O professor faltou ou tava em greve. Cansou de não ter o seu pra comprar suas coisinhas… começou a trabalhar… aí não achou nada melhor, porque não tinha mais estudo. Agora tali, deitado. Parece criança.

 

Levanta meu filho. Parece que tá dormindo… Ele dormia bem. Não deu trabalho esse daí. E foi o único. O outro, eu mais Calu achou que não ter e não nasceu. O médico do posto que me atendeu… que o aborto deu complicação… ligou as trompa, que disse que era melhor. Que eu não devia ter mais filho mesmo… Levanta, menino… Quando nasceu, primeiro foi a confusão pra arranjar leito no hospital. Mas ele era brabo e nasceu no corredor mesmo. Quase eu de pé. Eu gritava ‘tá nascendo’ e não tinha nem enfermeira nem médico pra aparar. Deitei no chão e ele começou a nascer. Foi assim. Agora taí, deitado. Ele tava lá em cima, no andaime… e agora, aí dormindo. Cansou. Levanta, meu filho. Vamo pra casa deitar. Amanhã tu acaba o serviço. Eu falo com teu pai.

 

Trechos de falas da personagem Néia.

 

Fonte:

ALEXANDRE, Marcos Antônio. Marcas da Violência: vozes insurgentes no Teatro Negro Brasileiro. Revista Brasileira de Estudos da Presença [Brazilian Journal on Presence Studies], Porto Alegre, v. 2, n. 1, p. 123-147, jan./jun. 2012. Disponível em: www.redalyc.org. Acesso em: 22 abr. 2025.

Crítica

Bela apologia da dignidade da mulher negra

Bárbara Heliodora (Jornal O Globo – 3 de abril de 2003)

 

A encenação é uma bela apologia da dignidade da mulher negra, com um texto que mistura a evocação de histórias e mitos das ancestrais africanas e os problemas do cotidiano da comunidade negra, sua luta pela dignidade individual e de grupos em face das barreiras, dos preconceitos ostensivos ou sub-reptícios […]

 

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Artigo

Visibilidade espacial:
aspectos da poética teatral negra a partir da interseção entre gênero, raça e sexualidade em Candaces da Cia dos Comuns*

 

CERQUEIRA, Gustavo Melo. Visibilidade espacial: aspectos da poética teatral negra a partir da interseção entre gênero, raça e sexualidade em Candaces da Cia dos Comuns. Revista Espaço Acadêmico, Maringá, v. 20, n. 226, p. 68-80, jan./fev. 2021. ISSN 1519-6186

 

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Cia dos Comuns

A Companhia dos Comuns surge no cenário teatral brasileiro no início dos anos 2000, período marcado pela intensificação das políticas afirmativas e pelo fortalecimento dos movimentos negros após a Constituição de 1988. O grupo se insere na genealogia de coletivos teatrais negros que, desde o Teatro Experimental do Negro de Abdias do Nascimento, buscaram criar espaços autônomos de representação artística.

 

Fundada em 2001 pelo ator e diretor Hilton Cobra, a Companhia nasceu com o propósito de criar narrativas com protagonismo negro tanto na cena quanto nos temas. Cobra reuniu artistas como Tatiana Tiburcio, Valéria Monã e Rodrigo dos Santos para formar um coletivo que funcionasse simultaneamente como núcleo de produção, pesquisa e militância cultural. O nome “Comuns” refere-se tanto à ideia de comunidade quanto à proposta de democratização do teatro.

 

Entre 2002 e 2014, o grupo desenvolveu intenso trabalho de pesquisa sobre a diáspora africana, experimentações com elementos da cultura afro-brasileira e parcerias com artistas como Márcio Meirelles e Zebrinha. A Companhia consolidou-se como um dos principais coletivos do Teatro Negro contemporâneo, transcendendo a representatividade para constituir um projeto político-estético de afirmação cultural.

 

Sua importância manifesta-se em múltiplas dimensões: desenvolveu metodologias baseadas em saberes africanos, descolonizando práticas teatrais eurocêntricas; ocupou espaços institucionais tradicionalmente negados a artistas negros; e formou novas gerações através de oficinas e debates. A trajetória de Cobra, que posteriormente presidiu a Fundação Cultural Palmares (2013-2014), exemplifica como a atuação da companhia influenciou políticas culturais nacionais.

 

Entre suas principais criações, destaca-se Candaces – A Reconstrução do Fogo (2003), que recebeu o Prêmio Shell de Música. Outras produções relevantes incluem Bakulo – Os bem lembrados (2005), A Roda do Mundo (2008) e o Festival Olonadé (2010-2016), que reunia criações de diversos grupos de teatro negro do Brasil.

 

A Companhia dos Comuns representa um marco na história recente do teatro brasileiro. Ao associar excelência artística, pesquisa estética e compromisso político com a luta antirracista, contribuiu para a afirmação do teatro negro como campo autônomo de criação e resistência cultural. Seu legado permanece vivo na cena teatral contemporânea, influenciando coletivos que seguem expandindo as fronteiras do teatro negro brasileiro.

Esta é uma página de um espetáculo selecionado no âmbito do projeto O teatro e a democracia brasileira. As informações nela contidas são de responsabilidade da Cia. dos Comuns na pessoa de …….., excetuando-se o texto do curador do projeto, sendo esse de responsabilidade da Foco in Cena, proponente deste projeto. Caso encontre um erro ou divergência de dados, favor entrar em contato através do e-mail contato@focoincena.com.br

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