O corpo, lugar privilegiado dos fantasmas, possui em si todos os signos, esbanja uma infinidade de sentidos, deixa-se traduzir em vários níveis, ou ainda, como uma boneca “gigogne”que esconde um sentido dentro de outro.

Em Liqueurs de Chair, o objetivo seria retirar do corpo um contentamento sensual e erótico a ponto de levá-lo aos limites do desequilíbrio dos sentidos.

Esta transformação, verdadeira reação química (no sentido da destilação, da maceração), evoca em mim uma sensação suave ao extremo, mas contém em si a ebriedade dos abismos, uma vez que, perto deste instante de fragilidade extrema, a exaltação do corpo chega ao seu apogeu, tudo oscila em direção ao inevitável, à destruição da alma, onde a morte se manifesta e a carne começa a segregar delicadamente esta substância açucarada e inebriante que pode gotejar sobre a pele como o suor, o esperma, as lágrimas e o sangue.

Os surrealistas bem o sabiam, eles que fizeram do erotismo sua musa favorita, que este depósito de sentimentos confusos e de movimentos fugazes é o licor seminal da criação.

Angelin Preljocaj