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Trilhas da Cena

TERRA ADORADA

Complô Cunhã (RS)

Direção: Jezebel De Carli e Ana Luiza da Silva

Estreia: 2019

Atualizada em 16/04/2025

Foto: Adriana Marchiori

Sinopse

Um espetáculo sobre nós, dirigido a nós, os brasileiros que não se consideram índios. Entrelaçando narrativas vivenciadas em terras indígenas Kanhgág e Mbyá Guarani, notícias jornalísticas, dados históricos, palavras de pensadores indígenas contemporâneos, além de memórias sobre sua origem indígena, Ana Luiza da Silva apresenta um olhar crítico sobre esse Brasil parido à força, inventado a partir das dores de mulheres pegas no laço. Um espetáculo sobre um país que “vai pra frente”…

O espetáculo

Terra adorada é um espetáculo teatral que mergulha nas raízes críticas e políticas da identidade brasileira, desafiando noções tradicionais de pátria e nacionalismo. Inspirado na emblemática frase do Hino Nacional — Terra adorada, entre outras mil —, a obra desconstrói símbolos históricos e questiona a idealização de um Brasil harmônico, expondo as feridas do colonialismo, do genocídio indígena, da escravidão e das estruturas de opressão de gênero. Com uma abordagem contundente, o espetáculo convida o público a refletir sobre quem são os corpos excluídos da narrativa oficial e como a violência estrutural moldou (e ainda molda) a realidade do país.

 

Na cena, a linguagem artística se destaca pela fusão de teatro físico e elementos multimídia, criando uma experiência sensorial e provocativa. Projeções visuais e referências ritualísticas dialogam com a cultura popular, especialmente com matrizes afro-brasileiras e indígenas, enquanto o corpo da performer torna-se um território de resistência e memória. A encenação experimental rompe com formatos tradicionais, utilizando a fragmentação e a poesia visual para traduzir conflitos entre o individual e o coletivo.

 

Criado a partir de um processo colaborativo de investigação cênica, o espetáculo se conecta diretamente com debates urgentes sobre justiça social, reparação histórica e o papel da arte na descolonização do imaginário. Sua narrativa não linear e simbólica desafia o espectador a enxergar além das versões romantizadas da história, propondo um diálogo crítico com o presente.

 

Com circulação em festivais e mostras nacionais, Terra adorada é reconhecido por sua ousadia estética e profundidade temática. Críticos destacam sua capacidade de tensionar a relação entre arte e política, oferecendo um espaço de reflexão sobre como reconstruir identidades a partir de vozes silenciadas. Ideal para quem busca um teatro que não apenas entretém, mas incita transformação, a obra é um convite para repensar o Brasil — suas dores, suas lutas e suas possíveis utopias.

Uma mulher está de costas, contemplando uma grande bandeira brasileira em uma parede desgastada. A parede tem tijolos expostos e tinta descascada, com sacos e cordas enroladas espalhadas no chão ao lado. Foto: Adriana Marchiori
Foto: Adriana Marchiori

Ancestralidade e luta de mulheres indígenas no sul do Brasil

Ana Luiza da Silva, atriz, diretora, autora e idealizadora do Complô Cunhã, de Porto Alegre, Rio Grande do Sul, aponta que o impulso para a criação do espetáculo Terra Adorada, em 2019, surgiu durante os dois anos de pesquisa in loco que realizou entre 2016 e 2019. Nesse período, Ana Luiza teve a oportunidade de se aproximar de sua ancestralidade indígena, frequentando o cotidiano de nações Kaingang e Mbyá-Guarani, que resistem no Rio Grande do Sul, e participando das lutas políticas por direito à terra, justiça social e reconhecimento oficial e prático de sua cultura.

 

Terra adorada é um espetáculo-protesto cuja voz feminina protagoniza o discurso cênico. Nele, ao mesmo tempo em que se relatam as violências sistêmicas contra as mulheres das nações indígenas no território nacional, desde a invasão portuguesa até os dias atuais, expõem-se as minúcias patriarcais e econômicas que sustentam a invisibilização e o silenciamento dessas existências. A consequência poética dessa abordagem é o convite explícito aos não-indígenas para refletirem sobre história, direitos, igualdade, diferença e o Brasil que se deseja construir.

 

No trabalho encenado pelo Complô Cunhã, estabelece-se um encontro intimista com o espectador, mediado por um diálogo direto, franco e crítico, em que a atriz tece a dramaturgia articulando pedaços de histórias dos povos ancestrais, narrativas de vivências pessoais, eventos políticos atuais, imagens históricas e vozes de personalidades indígenas brasileiras.

Os temas presentes em Terra Adorada incluem a discussão sobre a fetichização do corpo das mulheres indígenas pelo colonizador português e as origens da expressão “mulher capturada a laço”. Essa frase se refere ao processo de captura forçada de mulheres indígenas, uma prática violenta enraizada no patriarcado. Outra perspectiva do espetáculo remete às lutas dos povos originários contra o marco temporal e às batalhas cotidianas pela sobrevivência das florestas e das comunidades indígenas.

 

Em 2025, destacam-se alguns nomes importantes de artistas, ativistas e pesquisadores que, desde comunidades indígenas, ecoam saberes ancestrais e pautam questões urgentes para a comunidade, tanto dentro quanto fora das esferas de poder. Entre essas personalidades, podemos citar o líder indígena, ambientalista, filósofo e poeta Ailton Krenak; o ator, xamã e líder político yanomami Davi Kopenawa; o ativista político Raoni Metuktire; e a professora e atual deputada federal Sônia Guajajara. No entanto, a grande maioria das 300 etnias indígenas que compõem a nação brasileira ainda é precariamente assistida, vive em condição de abandono e desrespeito por parte do Estado e é vítima de práticas de extermínio orquestradas pelo poder econômico imperante em suas regiões.

 

O Complô Cunhã é um jovem coletivo de arte e cultura formado por mulheres comprometidas com as lutas sociais, a produção e o acolhimento de projetos artísticos e sociais idealizados por mulheres, bem como com pautas feministas e ambientais. A criação de Terra Adorada por esse coletivo representa um ato de resistência poética e política contra o apagamento de uma história que precisa ser enfrentada em toda a sua complexidade.

 

Sueli Araujo é pesquisadora e curadora do projeto O teatro e a democracia brasileira.

Vídeos

teaser

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espetáculo na íntegra

Terra Adorada - edição comentada

O vídeo exibe trechos do espetáculo Terra Adorada, com comentários de Julie Trudruá Dorrico. Trudruá é Macuxi, pesquisadora em literatura indígena, doutora em Letras pela Pontifícia Universidade Católica – RS. 

Clique aqui para assistir diretamente no canal da Complô Cunhã no Youtube.

Galeria de fotos

Esta galeria contém fotos dos seguintes fotógrafos: Adriana Marchiori, Gustavo Baggio, Laura Testa, Beto Rodrigues e Carina Macedo.
Os créditos específicos estão em cada fotografia. Clique sobre elas para ampliar.

ficha técnica

Idealização, pesquisa, atuação: Ana Luiza da Silva 
Direção: Jezebel De Carli e Ana Luiza da Silva 
Dramaturgia: Ana Luiza da Silva e Jezebel De Carli 
Colaboração dramatúrgica: Vika Schabbach 
Cenografia: Ana Luiza da Silva e Jezebel De Carli 
Iluminação: Carol Zimmer 
Figurino: Ana Luiza da Silva e Iara Sander
Trilha sonora pesquisada: Ana Luiza da Silva
Edição de vídeos: Carina Macedo
Produção: Complô Cunhã 

Críticas

Quem (sobre)vive, quem luta, quem enterra e quem vai pra frente?

Natasha Centenaro

 

Não se apaga a dor, não se esquece o trauma, não se escondem as marcas e cicatrizes da violência. Por mais que as tentativas de negacionismo e ocultação estejam agindo com força no país, é impossível refundar e reescrever o passado. Assim, o que as mulheres desse coletivo fazem é tratar essas marcas com respeito e responsabilidade artística e cidadã. Sobretudo, o que elas transformam em cena e para a cena (e no formato de vídeo) é o olhar de alteridade, admiração e respeito para com essas vidas e seus modos de existências. E isso, sim, é uma celebração dessas vidas indígenas. Uma celebração à vida e à alteridade.

 

Para ler a crítica completa, clique aqui.

DRAMATURGIA-TESTEMUNHO ou 

UM GRITO SOLTO NO AR

Diego Ferreira

 

Terra Adorada se coloca na cena com o desejo de legitimar um discurso muitas vezes abordado apenas nas aulas de história, de modo rápido e panfletário, mas aqui, diferente das abordagens escolares  o corpo e o discurso indígena está vivo, presente e com um discurso urgente.

 

Para ler a crítica completa, clique aqui.

Complô Cunhã

Uma logomarca com fundo vermelho e duas linhas curvas pretas e pretas entrelaçadas. O texto COMPLÔ CUNHÃ está escrito em letras brancas na parte inferior.

A Complô Cunhã é um espaço criado para mover projetos de, com e por mulheres. Desde seu surgimento, em 2019, realizou diversas feiras, oficinas e promoveu a participação das artesãs Kanhgág e Mbyá-Guarani em diversos espaços culturais de Porto Alegre, abrindo espaço e dando visibilidade para a arte das mulheres indígenas. Além disso, a Complô Cunhã é a produtora dos espetáculos Terra Adorada e CHUÁ – descobertas na água e mantém parcerias em projetos de outras mulheres.

Esta é a página de um espetáculo selecionado no âmbito do projeto O teatro e a democracia brasileira. A proponente do projeto é a Foco in Cena Produção Fotográfica e Teatral Ltda. O conteúdo desta página é de inteira responsabilidade daqueles que os disponibilizaram para publicação. Caso encontre um erro ou divergência de dados, favor entrar em contato através do e-mail contato@focoincena.com.br

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