Trilhas da Cena

FERIDA SÁBIA

AnaVitória (RJ)

Duração: 50 min

Estreia: 2012

Atualizada em 27/02/2024

Foto: Renato Mangolin

Ferida Sábia explora o universo feminino a partir de um ponto de vista autobiográfico, tratando dos ritos de passagem da puberdade, da maternidade e da velhice. A performance compõe a trilogia Afinal o que Há por Trás da Coisa Corporal?, iniciada em 2010 pela também coreógrafa AnaVitória, que dirige a montagem.

Foto: Renato Mangolin

“A instalação plástica/coreográfica proposta por Ana Vitoria, saturada pelo vermelho, produz inicialmente um efeito de encharcamento, não apenas o de banhar-se em sangue, mas aquele que escorre de dentro para fora, deixa suas marcas, seus signos de gênese de vida – e nos impregna. Logo em seguida, surgem os entre vermelhos: detalhes de carne, de panos e outros objetos, cada um transpirando uma perturbadora vivacidade, como se a proximidade do sangue os tivesse contaminado com sua força própria. No fundo de um vaso, uma pequena gota vermelha escorre silenciosa, mais adiante explode abruptamente e logo sugere a cena de um crime, ao mesmo tempo que provoca um impulso de puxar a descarga e eliminar a evidência. As migrações do vermelho sugerem percursos, seus rastros e impregnações se abrem a novas incorporações de sentidos e produção de alegorias e, ao mesmo tempo em que des-singularizam o objeto cotidiano, lhe inferem um novo valor, agora no espaço da imaginação.” 

 

Regina Miranda

Durante anos e anos de nossa existência, temos o privilégio de um encontro. Todos os meses, nos olharmos pelo avesso. Esse mergulho e reencontro encarnado se dá por um lento e contínuo descamar… Como uma troca de pele, processamos em nosso corpo uma auto – limpeza orgânica e espiritual. Aí se dá, para a mulher, seu maior enfrentamento na vida; constatar o tamanho da sua força, dos fluxos que correm e escorrem pelo seu corpo, que aborta é fértil e fecunda. Receptáculo de nós mesmos e do Mundo, a menstruação é esse espelho que nos revela com a pele arrancada, sem a carne, sem os ossos. Fluxo de vida que percorre nossas entranhas e vísceras, o avesso de nós mostrando que ainda somos atavicamente ligadas aos ciclos da natureza e ainda tecemos nossos laços com a ancestralidade. Esse deflorar-se que pacientemente e resignadamente carregamos é também a potência e a abertura para virmos a ser outros…

 

 AnaVitória

Durante séculos, as mulheres permaneceram condenadas ao seu destino biológico. Reiterados valores androcêntricos − muitas vezes, francamente misóginos − fizeram cristalizar uma “diferença” em que o feminino, sempre na condição de polo oposto, inferior e periférico, permanecia determinado por desvios inscritos na superfície corporal. Como a suposta fraqueza não levaria à dependência? Como a exaltada sensibilidade não suscitaria a desrazão, mesmo a loucura? Como a reprodução, enquanto inevitável destino, não ensejaria o confinamento sob a máscara do cuidado?

Assim se construiu o imaginário que, aproximando a mulher da natureza − selvagem, enigmática e perigosa −, determinou como dever masculino o exercício da dominação: numa suposta “guerra dos sexos”, ao homem caberia a tarefa civilizatória.

 

Henrique Marques-Samyn

Equipe

Concepção geral e direção 

Ana Vitória

 

Intérpretes
Ana Vitória
Priscilla Teixeira
Marina Magalhães
Soraya Bastos

Participação Especial
Angel Vianna

 

Assistência de coreografia Renata Costa

Ambientação Sérgio Marimba

Desenho de Luz Milton Giglio

Figurinos Ticiana Passos

Trilha sonora organizada AnaVitória

Visagismo Rose Verçosa

Desenho de som Michael Sexauer

 

Fotografia Renato Mangolin

Vídeo Mônica Prinzac

Programação Visual Nucleo-i / Gabriela Horta

Assessoria de Imprensa Raquel Silva

 

Produção Neco FX

Realização Iroco Produções Artísticas

Vídeos

Teaser

Espetáculo completo

Clipping

Material complementar

AnaVitória, bailarina, coreógrafa e curadora da exposição, comenta o impacto da presença de Angel Vianna na Universidade Federal da Bahia (UFBA), onde a homenageada do programa Ocupação lecionou durante a década de 1960, e destaca sua força expressiva e o desenvolvimento de um trabalho original que já se distanciava da educação tradicional da dança.

Porque é preciso levar em conta que o ponto de partida, aqui, é o corpo − ou, para falar de modo mais específico: um estado corporal, enredado numa teia de significações que de múltiplas formas o configura; que, em diferentes culturas, foi associado à “essência feminina”, como manifestação espontânea de sua proximidade com a “natureza” indomada; que, a partir disso, serviu à ordem patriarcal como recurso para atestar a “impureza” da mulher, sua condição maldita, como alguém (ou algo) de que(m) se deve guardar distância, pelo que encerra de sinistro ou perturbador. Camisolas, calçolas e anáguas operam como índices dessa feminilidade concebida a partir de uma dimensão biológica, (…)

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