DECOR
Denise Stutz (RJ)
Duração: 30 min
Estreia: 2003
Atualizada em 01º/08/2024
Foto: Renato Mangolin
DeCor
Denise Stutz (RJ)
Duração: 30 minutos
Estreia: 2003
Atualizada em 01º/08/2024
Foto: Renato Mangolin
Sinopse
A artista Denise Stutz inscreve em seu corpo a questão da memória e as relações da sua identidade na dança, na cena e no movimento. Assim, se permite brincar com o espaço e o tempo, fazendo dessa dança um jogo de imaginação. Em alguns momentos, ela transforma o espectador em parceiro e o convida a ter um olhar de contemplação, imagens e pensamentos.
Ficha técnica
Texto, direção e interprete: Denise Stutz
Musica: Claire de Lune – Claude Debussy
Denise Stutz
Denise Stutz iniciou seus estudos de dança em Belo Horizonte. Em 1975 junto com outros 10 bailarinos fundou o Grupo Corpo. Trabalhou com Lia Rodrigues como bailarina, professora e assistente de direção. Foi professora do curso técnico da Escola Angel Vianna.
A partir de 2003 começa a desenvolver seu próprio trabalho solo, se apresentando nas principais capitais do Brasil,na França, Espanha, África e Austrália. Seus 3 solos foram apontados pela crítica de O Globo como um dos dez melhores espetáculos apresentados no Rio de Janeiro nos anos de 2004 (DeCor), 2013 (Finita) e 2015 (EntreVer) (2015). Seu último trabalho solo, Só, foi apontado pela crítica como um dos destaques do festival Panorama da dança no ano de 2018.
Fez parte do Coletivo Improviso dirigido por Enrique Diaz, atuando nas peças Não olhe agora e Otro.
Trabalhou com o diretor Luiz Fernando Carvalho como coreógrafa nas minisséries Hoje é dia de Maria, Capitu e Clarice só para mulheres, da TV Globo e fez parte da equipe de preparação dos atores da novela Velho Chico.
Foi duas vezes selecionada pelo projeto Rumos Itaú Cultural para desenvolver os trabalhos Justo uma imagem (2009) e EntreVer (2014).
Em 2015, junto com Dani Lima, Cristian Duarte, Alex Cassal e Marcio Abreu dirigiu o projeto 6 modelos para jogar para o Itaú Cultural.
Em 2018, dirigiu a peça Sobre o que não sabemos para o Grupo Roda Gigante e atuou na montagem da peça A Mentira, de Nelson Rodrigues, com direção de Inêz Viana.
Assinou a direção do infantil Máquina do Tempo com Guilherme Stutz e da peça Que mundo deixaremos para Keith com Sérgio Medeiros e Leo Corajo.
Em 2021 estreou a peça Partida ao lado da atriz Inez Viana, com direção de Debora Lamm. Foi protagonista, junto com Isabel Kowarick, no filme Nada, do diretor Adriano Guimarães.
Dirigiu e coreografou em 2022 o Grupo Movidos, da cidade de Natal ,no espetáculo Remix.
Trabalhou na preparação de corpo do elenco da novela Elas por Elas, da TV Globo.
Recentemente, dirigiu as atrizes Eliane Costa e Damiana Inês na peça Desabamentos com estréia no Sesc Copacabana. Junto com o diretor e ator Duda Rios dirigiu a multiartista Zahy Tentehar na peça Azira’l com estreia e temporada no Centro Cultural Banco do Brasil.
Vídeos
Artigos
Uma história de colaborações com o teatro no percurso artístico de um corpo que dança.
Lilian F. Vilela (Revistas USP)
(…) Assim, como resposta às provocações feitas no Dialogue, surgiu o seu primeiro solo de dança: DeCor (2003). Decor, De cor, Du coeur, De coração, Decorado. Neste trabalho, a artista ativa sua fisicalidade acessando aquilo que ficou decorado em sua história artística: as lições aprendidas decor instaladas no corpo, as danças de Martha Graham, as sequências coreográficas vividas, os modos de fazer dança no Corpo, com Lia Rodrigues, os treinamentos corporais impressos como inscrições em seu corpo.
Como marcas e mapas, ela mergulhou em si pelas inscrições de sua dança vivida e em suas memórias – ali atualizadas no presente – e as partilhou em cumplicidade com o público, trazendo para sua história uma nova dança pessoal.
Em DeCor, ela sobrepôs formas de “se lembrar” no corpo, evidenciando hábitos, memórias e inscrições instaladas no corpo, portanto decorados e, sobre os quais ela se debruça para poder registrar o que faz dela, ela mesma.
A busca do outro lugar no corpo, do personagem que é, em muitos momentos da arte, o mesmo ser, porém revisitado.
A criação artística não se constrói do nada, a criação pressupõe a realidade do conhecimento que a liberdade do artista transfigura e formaliza. “Tudo é construído sobre o anterior.” (Ernesto Sábato em entrevista apud SALLES, 2004, 88).
O anterior de Denise são suas memórias, suas histórias inscritas no corpo. A elaboração destes elementos no processo criador se dá em transformação ou combinação inusitada, por vezes, imperceptível aos olhos do espectador, porém, de alguma forma, lá.
O processo criador é feito de acúmulos e eliminações, aparições e desconstruções. Denise, em sua sensibilidade poética, une, faz fundir experiências díspares em uma unidade, o processo criador de DeCor teve como ação transformadora atar um elemento vivido a outro aparentemente disperso, mas contido na mesma matéria que dança: seu corpo. (…)
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Atuar de verdade. A confissão como estratégia cênica
Óscar Carnago (Tradução do original em espanhol de André Carreira)
(…) Quando Jean-Luc Godard se propõe fazer a(s) história(s) do cinema, sua presença na primeira pessoa, escrevendo ou falando, é também constante. Em um momento afirma algo parecido ao que se dizia em Berlim 10/90: O sentimento que eu tenho da existência não é ainda um ‘eu’. Nasce em mim, mas ainda sem mim. E continuando agrega uma pequena reflexão que por seu conteúdo em chave performativa resulta interessante: A verdadeira condição do homem é a de pensar com suas mãos. Em que medida a confissão é também um modo de pensar com o corpo, um pensamento performativo?
Ao longo dos anos 2000 a bailarina brasileira Denise Stutz realizou três solos nos quais expôs uma reflexão sobre seu trabalho, sobre sua história como profissional da dança, que se entrelaça com sua história pessoal. De certo modo, esta necessidade de reflexão, na medida em que dá lugar a um tipo de obra confessional, pode situar-se em paralelo ao trabalho de Krammer. Se este deixou de filmar (sem por isso deixar de fazê-lo) para se apresentar a si mesmo, Stutz deixa de dançar (sem deixar de fazê-lo tão pouco) para apresentar sua história em primeira pessoa, uma história que forçosamente é a história (dança contemporânea) escrita sobre um corpo.
Outro elemento para desenvolver este paralelismo é a tensão com o outro, com o que está olhando, com a que se trabalha em ambas obras. Tanto Krammer como Stutz buscam uma proximidade, não carente de tensões, com o que tem adiante. O mundo, diz o diretor norte americano, no momento da filmagem está reduzido à minha relação com o outro, eu e isso, ou em palavras de Stutz, você e eu, eu e você, você e eu… lema que se repete de maneira obsessiva ao começo destes 3 solos em 1 tempo (2003-2007), sublinhando, já desde o começo, que o eixo de relações com o outro está no centro desta história profissional e afetiva.
Com uma longa trajetória na dança desde os anos 70, Stutz propõe ao espectador, um outro imaginário, mas ao mesmo tempo real, que ela escolhe entre o público, um pas-à-deux, um solo para dois, na intimidade, e sem se mover da poltrona de onde vai realizar com a presença ilusória desse espectador que a pega, carrega, gira… Depois da dança conta sua história, sua história pessoal e sua história profissional, desde que começou na dança, fundando em 1975 com outros bailarinos o grupo Corpo para passar em 1990 a formar parte da Cia. de Lia Rodrigues. No último solo apresenta, como se de um filme mudo se tratasse, uma sucessão de posições físicas, com o corpo nu, nas que se lê como em estampas fixas a história da dança do Século XX.
Em um momento da atuação Stutz lê uma carta pessoal escrita a outros profissionais da dança brasileira. Nela, uma vez mais, os compromissos políticos se misturam com as necessidades pessoais:
Queria dançar algo importante, protestar contra a violência, algum pensamento político ou filosófico, falar da miséria humana. / Mas somente consigo expor minha fragilidade. / Queria dançar para salvar os outros. Mas danço, queridos amigos, para salvar-me a mim. (…)
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Coreobiografia ou biocoreografia?
Roberto Pereira (Os nomes próprios da dança brasileira)
(…)
Mas ainda mais instigante, no sentido que esse texto caminha, parece mesmo ser o que a bailarina Denise Stutz (1955) propõe em seu solo intitulado DeCor. Apresentado na mostra Solos de Dança no SESC, em março de 2004, trazia o seguinte texto em seu programa: A memória impressa no corpo – uma história. Transformar essa história em algo legível, fazendo da memória, do tempo e do espaço um jogo cênico. Um passado no corpo que se transfigura em um futuro na cena.
Traduzindo uma já tradução, esse texto aponta para o que na cena se resolve quase que como um compêndio, ou seja, uma derivação por metáfora: “uma pessoa ou coisa que resume ou simboliza em si um período histórico, uma teoria ou doutrina, uma ou diversas qualidades” (Dicionário Houaiss).
Stutz, como bailarina que é (e como se assume), desnuda sua história em danças que habitam seu corpo, tal é a maturação que essas danças-idéias-técnicas foram sendo nele impregnadas. Os coreógrafos Lia Rodrigues (1956) e Rodrigo Pederneiras (1955), por exemplo, explodem na cena, mesmo que seus nomes não sejam citados. E Denise, que narra a partir do lugar do intérprete (a certa altura, ela diz em cena: “a minha memória é a memória dos outros”), transforma-se em um livro dessa biblioteca da encenação da qual fala Jérôme Bel, ou num livro repleto de referências a ser folheado (no caso, por ela mesma), como diria Kylián.Uma auto-biografia, que está em seu corpo e em sua fala. Ou,ainda mais instigante: uma autoficção, recuperando um termo cunhado pelo escritor francês Serge Doubrovsky, ainda na década de 1970mais instigante: uma autoficção, recuperando um termo cunhado pelo escritor francês Serge Doubrovsky, ainda na década de 1970.
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